A CONDESSA SEM CHETA

A CONDESSA SEM CHETA
MY BOOK

Wednesday, 14 September 2011

MOMENTO DE ALMA - DENTRO DE OUTRO TEMPO...


Minha alma, desconcertada,
Com farrapos vestida,
Tenta esconder minha dor
Que, de tanta nudez, suspira
Por abrigo e por amor.
Se ela se satisfizer
Com brocados e pedrarias
Recorrerei a tempos idos,
Onde as damas os usavam
E ornavam seus vestidos.
Procurarei outros bálsamos,
Para curar os ferimentos
Por onde espreita a alma
Que, de tanta dor vivida,
Vive em estado de alerta.
Meu corpo, despido porte,
Com trapos, sem honrarias.
Que uns e outras o abrigam,
De todas as intempéries.
Mas, com a angustia do mundo,
Como, minha alma, serenar?
Procuro, somente, um abrigo
Para a minha alma acolher.
E se ela assim o exigir,
Me vestirei de bordados
Que tapem as minhas carnes,
Que abriguem minha alma
Porque a sinto descontente.
Como me ressinto deste desprazer
De que meu corpo não pode falar.
De onde vem o desconforto?
Vem do corpo, vem da alma?
Vou, a fundo, investigar
De onde vem o sofrimento.
Nem que tenha de voar
Para dentro de outro tempo.
Será que lá encontrarei,
Algum remédio, a solução?
Algo que aguente o bater
E que blinde meu coração.
Mas faltava a angustia somar-se
A este momento tremendo.
E meu corpo, assim assustado,
Será que treme de medo,
Ou estremece, antes, de arrepio?
Ou está apenas a manifestar
Este meu estado ansiedade,
Por se sentir abandonado,
Pela alma errante, hirta.
Se tiver que vestir o corpo
Com brocados e bordados,
Farei todos os caminhos
Para minha alma alcançar.
Eu sei que, meu corpo, reclama
Trapos para o vestir.
É que a alma, inocente,
Apenas não está contente,
Com todo este sentir.
Do outro lado vem o sinal
Para o meu corpo aguentar.
A alma tem que sobreviver,
No corpo terá que habitar.
Ela, lá, mora a gosto
E não consente distração.
Ela sabe o que tem pela frente,
Ela conhece bem sua missão.
Todo este descontentamento
Vem só do momento presente,
Deste mundo descontente
Que, aos poucos, meu corpo mina.
Mas minha alma, despida,
Nem sequer se contradiz.
Nada reclama, nada precisa.
Requer só a minha atenção,
Para que o corpo não sofra,
Em vão…

POR JOAQUINA VIEIRA

14/09/2011

VEM, VOA...


Toma, rápido, a dianteira,
Com tua mão, certeira.
Veste teu fato de festa
Que teu laço é tua meta.
Toma já a dianteira
E voa com as andorinhas.
Faz, com elas, o teu ninho
Forrado de trigo, dourado
Com o pó do céu estrelado.
Leva-me, como teu guia,
Para dentro da tua morada.
Deixa, fora, teu pensamento,
E alia-te aos elementos.
Verás teu corpo a vibrar,
E teu criador a querer-te curar.
Veste a túnica da cura,
Onde reina outro mundo,
Fora da tua cabeça.
E antes que eu adormeça
Quero, no teu império, entrar,
Quero, contigo, festejar,
Nessas estradas já reparadas,
Onde nos espera a ventura.
Ninguém mais, só tu e eu.
Desejo-te, a meu lado,
Rejuvenescido, animado,
Vivendo o milagre da cura.
Viajaremos em tua nave
E correremos o teu mundo.
Abandona o teu pessimismo,
Numa cerca longínqua, fechado,
Para que possamos voar.
Tu comigo e com o pensamento,
Aliados numa corrente,
Onde entrem os elementos
Que te conseguem curar.
Dá um tempo a teu corpo
Que, de gasto e cansado,
Começa já a reclamar.
E protestas, a seguir, tu,
Da tua desventurada vida
Que, quando boa, não brindas,
Que, quando má, te naufraga.
Vem comigo, agora, João.
Vem, voa, dando-me a mão.

POR JOAQUINA VIEIRA

14/09/2011

PLANADORES



Gente que se move, inócua,
Pela vida, planando.
Levados pelos ventos,
Em labirintos da mente, fechados,
Sem nunca encontrarem nada
Que justifique a sua chegada.
Da vida, cedo se ausentaram
E, distraídos do mundo,
Voaram do propósito da criação.
Aqui, jamais encontraram
Uma justificação para estarem.
Sua marca poderiam deixar se,
O seu umbigo deixassem de mirar.
O que fizeram com o cérebro
Com que foram presenteados?
Seus talentos, congénitos, por si,
Jamais foram descobertos.
Do mundo sendo, apenas, um acidente,
E, de tudo, distraídos, desaparecidos,
São bocas com línguas afiadas e dentes
A mastigarem cadáveres inofensivos.
Desperdiçam a sua energia
Em festanças e distracções,
Tramando vidas e amigos.
Assim a vida se esvai,
Por entre penas, por entre nadas.
Folhas derrubadas por ventos,
Como suas vidas, caídas.
E nada há que os afecte!
Mas o dia, esse dia está certo,
Como certo esteve o de ontem.
A muitos lhes basta a comida na mesa
E, em frente dos olhos, a televisão.
A roupa está sempre à mão,
O programa em antevisão.
O dinheiro, na sua conta pousado,
Do esforço de outros, saqueado.
E lá continuam, planando,
Como se fossem apenas abutres,
Em cima das copas das árvores.
Não existe, para eles, a saudade,
Porque de nada de notável se recordam,
Porque esforços não despenderam,
Nem para ajudar, jamais, alguém.
Passaram, sempre ao lado, mais além.
A vida se vai, para eles, esgotando,
Assim, devagarinho, sem alarido.
Sentados na poltrona da vida,
Não pensam, não agem, estão.
São tão iguais, que não se distinguem
No meio da manada, amansada, que pasta,
Esperando, por eles, ser devorada.
Mas há outros que, remando,
Vão vencendo a corrente adversa,
E ousam apontá-los e enfrentá-los
E que se atrevem a sonhar, intervindo.
É quando, por fim, os planadores,
Servindo-se de seus ferozes lacaios,
Também estes planadores,
Reagem com bestial violência, primária.
Todos eles, deste mundo, partirão
Sem nunca aprenderem nada.
Porque estiveram assim, servidos.
Vestiram-se de presunção
Ou serviram com devoção,
Planando, planando, em vão.
E, no fim, o que lhes resta?
Pobres coitados, bem vestidos,
Morrerão inúteis, planando.


Por Joaquina Vieira