A CONDESSA SEM CHETA

A CONDESSA SEM CHETA
MY BOOK

Friday, 17 July 2015

O PREÇO DA ETERNIDADE






Seremos apenas imaginação?
Porque nos deram sombra,
Para que nos plantaram?
Será só para sermos chorados
Quando formos velados,
Já mortos os nossos pecados?
Ou para sofrermos com o tempo,
Sabendo que somos ponteiros
Dum relógio que desconhecemos?
O preço da eternidade.
É isso. É desvairarmos no mistério,
Desbravando o desconhecido
Que será o caminho vencido,
Fazendo-o frutuoso e sabido,
Antes de jazermos em cemitério.
Chorar é como derramar
A água retida nos rios,
De onde transbordam os mortos
Depostos em nossos braços.
Saudosas as despedidas,
Em mãos que estão por colher.
Tudo o que nos é emprestado,
Num instante, nos é retirado.
Dão-nos mãos aprontadas:
- Para trabalharmos a terra;
- Para fazermos a guerra;
- Para pormos termo à vida.
Dão-nos uma mente temperada:
- Para sairmos da Terra;
- Para fazermos a paz;
- Para prolongarmos a vida.
Nisto consistirá a existência?
Num mundo dos mundos,
No mundo dos túmulos,
No mistério das trevas,
Teremos que esquecer, um dia,
O cintilante firmamento.
É isso. Acender estrelas.
A vida de cada um de nós
É uma estrada, às escuras,
Que teremos que iluminar
Com estrelas que são ideias,
Com inventos feitos candeias.
Com contributos e achamentos,
Iluminemo-nos, sem demora,
No febril acontecer, na hora
Que é cada novo alvorecer.
Porque na noite das noites,
Na rainha de todas noites,
Teremos que adormecer.
Que poderemos então fazer,
Largado o altar e o terço?
Escrever um verso de esperança,
Para ser cantado sobre o berço
Que embala a doce criança.
O que será, então, viver?
Não é, disso estou certa,
Apesar da certeza instalada,
Propagandeada e aproveitada,
De ser ócio, vício e diversão,
De se ser anónima na multidão.
Viver é estar acordada e desperta
Enquanto o abutre ressona?
Ou será enfrentá-lo no momento,
Na hora do seu festim,
Fazendo com que deserte
E não acrescente deserto,
Ao deserto já plantado?
Será a vida uma prece
Para a vida que se tece,
Com corpos e corações,
Cumprir as suas missões?
Somos breves, mas um dado,
Deste espaço de sensações,
Complexo e ilimitado,
Que para nós foi inventado.
Somos como os peixes,
Largados ao acaso
Num oceano de feitos.
O milagre escapa
No Hino da Alegria,
Até que a humanidade entoe
Uma ode à poesia.
De que vale o carrasco e a forca
Se todos acabamos mortos?
De que vale estar aqui a escrever
Se os cegos não me irão ler?
Ainda que aprovisionados,
Teremos que nos render
À noite de todas as noites.
Na vida de um só dia
Quase tudo se perde,
Mas muito se cria e recria.
Mas, na noite da nossa morte,
Nada haverá de mais forte:
- Perderemos o Sul e o Norte.
Mas se marcarmos as bermas
Da nossa estrada, a vida,
Com marcas de humildade,
Pedaços de eternidade,
Só assim compreenderemos
Que não será só para morrermos
Que fizeram com que nascêssemos.
Será para, no entrementes,
Semearmos as nossas sementes,
Aprimorando a criação.



Autora: Joaquina Vieira






































Escrever, apenas para ser roubada, não é do meu interesse. Por isso, vou continuar a escrever para a gaveta. Talvez, um dia, alguém entenda o que eu faço. Não é possível superar os interesses e os malandros instalados.