A história que vou contar,
É sobre o homem, o pirata,
E o que se passa dentro dele.
Com seus micróbios se debaterá.
Inventor por natureza,
Vale-se da sua inteligência,
Para o mundo atropelar.
É ele que faz as armas,
Para, com elas, matar.
Ergue aldeia, vilas, cidades,
Para, de seguida, as arrasar.
Mas não passa de um fugaz.
São tantas as injustiças,
De tudo o homem é capaz.
Tudo derruba, tudo ergue,
Em tudo se intromete.
E inquina. E sonega.
Ele se acha o mais forte,
Da força, faz seu archote.
Faz a guerra, supremo mal.
Semeia gente no mundo,
Sem saber se é capaz,
De, a todos, dar a paz.
Ele guerreia pela terra,
Que, um dia, o cobrirá.
Utiliza vírus, que cria,
Com o fito de atormentar.
O homem é um inventor,
O homem, de tudo é capaz.
Mas nunca se apercebeu,
Que a sua guerra diária,
Um dia o irá derrubar.
Bastarão uns micróbios,
Umas células infectar,
Aí começa, para ele,
Uma luta sem quartel,
Batalhas a enfrentar.
Tudo o que disse,
Tudo o que fez,
Tudo ficará para trás.
Veio de dentro de si mesmo,
Veio de dentro do seu poder,
Tudo o que fez e não devia.
Tudo ficará para trás.
E o poder do Universo?
Tudo que fez, terá reverso.
Tudo estará contra ele.
Ele que fez o que fez,
Ele que fez porque fez.
E tantos que atropelou,
Sem nunca se dar conta,
Que, sempre, lhe chega a conta.
E, um dia, ai do seu corpo,
Algo, o irá derrubar.
Agrupam-se, formam exércitos,
Todos os micróbios nas células,
Aos poucos, o vão vergando.
E tiram-lhe todo o poder.
E, sem querer, sem potência,
Na cama, vai ficando.
Nem lhe valerá a ciência.
Ali, com tempo para pensar,
Pensa em tudo o que fez,
E em tudo o que não fez.
E por erro ou omissão,
Por cobardia ou depravação,
Pensa em pedir perdão.
Ora a um Deus, imaginário,
Que, dele, esteve ausente,
Durante as suas barbáries.
Ora a um infeliz, condenado,
Vitimado por suas aleivosias.
E, aos poucos, vai cedendo.
E depois de tudo correr,
De procurar o remédio santo,
Vai gastar a sua fortuna,
Conseguida pelo infortúnio,
Que em outros incendiou.
Quer continuar no mundo,
Que, ele próprio fez, imundo.
Mas a batalha está travada.
Tem o seu tempo contado.
E já nada poderá fazer.
Mas fez e tanto fez. E desfez.
Tanto que não deveria ter feito.
Deixa-se, na cama, vencer,
Deitado, tombado, perdido.
Ele que fez e desfez, desfeito.
Todo o mal que disseminou,
A desgraça que implantou,
Tudo, contra ele, se virou.
Está, agora, atormentado,
E, sozinho, desprotegido,
Derrotado, estarrecido,
Ele não sabe vencer a dor
Que, por dentro, o corrói.
A dor que já corroeu,
Os outros a quem ele rompeu,
As barreiras da dignidade,
Vítimas da sua maldade,
Quando estava no apogeu,
Da mais infame crueldade.
E recorre à suprema promessa.
Não há tempo. Tem pressa.
Promete que será um santo,
Se Deus o quiser curar.
O mesmo Deus que não curou,
Os outros que trucidou.
E reza e ora. E ora e chora.
Promete sua vida mudar,
Mas seu tempo está a acabar.
E o tempo que fez acabar,
A tantos que mereciam tempo,
A tantos a quem o roubou?
Ele se esgotará, arrependido,
E se questionará, esquecido,
Da dor que fomentou,
Dos outros que ele matou.
O homem que, de tudo, era capaz,
Desfalecido, numa cama, jaz,
Pelos seus comparsas, esquecido.
Para que lhe serviu, a ferocidade,
Se, agora, deitado,
Pela dor, vergado,
Impotente, derrotado,
É um nada, que de nada é capaz.
Seu reino deixa para trás.
Pobre humano, criador,
Do sofrimento e da dor,
Da desgraça e humilhação,
Imperador na destruição,
Apaga-se o seu coração,
Pelos vermes, será comido.
Mas logo é substituído.
Por outro verme, presumido,
À espera, em ascensão.
Ele, que só deixou devastação,
Poderia ter contribuído,
Para um mundo melhor.
Mas, nele, só cultivou,
O seu lado mais violento,
A semente que não vingou,
O cruel que esteve atento,
A tudo que o maculou.
Dele nada restou.
Menos a dor, por si, espalhada,
No tempo que desperdiçou,
No tempo que, a outros, roubou.
Dor, por outros, herdada,
Dele, que já não é nada.
Autora: Joaquina Vieira